Como a
juventude adora ler e está muito mais interessada no Mensalão do que nos
requebros do axé e do futebola, aqui estamos em nossa missão de ensinar a
pensar, porque todos os nossos males decorrem apenas da falta de se dedicar
algum tempo conjecturando se está certo o modo de vida como vivemos. Na certeza
de estarem todos ligadíssimos em tais assuntos, mesmo porque eles tem tudo a
ver com o fato de já estarmos ficando sem água e logo ficaremos sem nada, estou
aqui novamente atendendo à ansiedade da juventude em aprender coisas outras que
não soltar bombas e requebrar no axé e no futebola. Assim, vamos pensar sobre o
seguinte:
No trabalho
DIREITO AO DELÍRIO, do filósofo e escritor Eduardo Galeano, entre outras coisas,
o filósofo classifica de estúpido o comportamento de quem vive apenas para ter
ou para ganhar. Conta-nos o filósofo e escritor que estava em companhia de um
argentino diretor de cinema chamado Fernando Birri em uma palestra para jovens estudantes
na Índia, e que os estudantes faziam pergunta ora a um dos palestrantes ora a
outro, quando um dos jovens perguntou ao argentino para que serve a utopia. A
resposta do argentino assume ares de poesia: “A utopia está no horizonte, eu sei muito bem
que não a alcançarei, se eu ando dez passos, ela se afastará dez passos. Quando
mais a procure, menos a encontrarei porque ela vai se distanciando. A utopia
serve, pois, para CAMINHAR”. Sendo este o entendimento de dois ilustres
figurões do mundo do saber, porquanto o filósofo concordou plenamente com a
resposta, não haveria a princípio motivo algum para discordar dela. Entretanto,
este seria o comportamento de quem não pensa porque há utopia inteiramente
alcançável e realizável no novo entendimento de Raul Seixas, Cazuza, Bob
Marley, Guevara e tantos outros como Edson Luis, jovem estudante morto pela
ditadura militar por defender um mundo diferente, um mundo bom, coisa só
inalcançável dentro do pensamento velho que deu origem a uma cultura depravada
onde a prostituição midiática, o roubo, a mentira e o sofrimento são comuns.
Considerar inalcançável a existência de um mundo bom é condenar-se à vida
medíocre de viver para trabalhar e fugir dos ladrões comuns porque é impossível
escapar dos ladrões da política.
O dicionário
Aurélio, ao lado da definição tradicional de coisa inalcançável, também define
a utopia como uma fantasia do pensador inglês Thomas Morus ao sugerir a
existência de um país onde todos fossem felizes. Ser feliz é o sonho de cada um
e ele só é irrealizável enquanto não se envidar esforço para sua realização. Não
haverá felicidade no mundo enquanto cada um tiver como objetivo tomar alguma
coisa do outro. A absoluta maioria das pessoas não aprendeu a pensar e por isso
dá mais atenção às brincadeiras e à produção de riqueza.
Pode muito bem
a humanidade realizar o sonho de Thomas Morus e fazer felizes todos os países
do mundo, bastando participar da aplicação dos recursos públicos. As pessoas
são infelizes porque lhes faltam as coisas das quais necessitam e não há motivo
para que haja quem não possa tê-las enquanto outros as tem demais.
Estamos em
direção contrária à que leva a alguma felicidade. Ela só pode ser alcançada
quando não houver mais débeis mentais que se sentam sobre uma montanha de
dinheiro estando arrodeados de famintos ignorantes. Quando as pessoas passarem
do estado de manada a que se refere o poeta para o estado de pessoas
civilizadas a que se refere Thomas Morus, aí haverá sociedade pacífica. A paz é
o componente principal para a construção da felicidade. Se nos é ensinado ser
impossível ser feliz e que é possível um velhinho voar numa carroça puxada por
veados alados, de tal aprendizado não participa a capacidade de pensar. Embora
a juventude considere tais conjecturas como “prosa” de velho, elas também
passaram pela cabeça dos ilustres jovens citados e, portanto, “prosa” é a
indiferença ao futuro que a ciência está a anunciar e a acomodação à tradição.
Lutar por um lugar onde as infelicidades provenham apenas da indiferença da
natureza para conosco em vez de serem produzidas em maior quantidade pelas
próprias pessoas não é coisa impossível de ser realizada. Pelo menos a utopia
sonhada por Thomas Morus podemos perfeitamente tornar realidade. Basta que
todos estejam interessados em saber como está sendo empregado o dinheiro
público. Há dinheiro suficiente para que todos tenhamos bem-estar. A existência
de miserabilidade deve-se apenas ao modo como são empregados os recursos
públicos direcionados apenas para servir a uma classe denominada de
aristocracia. Sobre ela ainda teremos oportunidade de pensar a respeito.
Fica evidente
o alheamento da juventude para com as coisas das quais depende seu bem-estar ao
se constatar sua indiferença quanto ao julgamento do Mensalão. Quando houver
interesse social pelos assuntos que dizem respeito às pessoas, aí começará o
surgimento do mundo bom. O Mensalão é um dos muitos motivos de infelicidade
geral, é mais um roubo imenso do erário feito por uma quadrilha organizada por
políticos e empresários e que está dividindo o produto do roubo com uma plêiade
de advogados, entre eles um que era ministro da justiça e cujo nariz cresceu
ainda mais com as mentiras de garantir que o ladrão não é ladrão. Até entre os julgadores pagos pelo povo para defender
seus interesses há quem se proponha a defender a quadrilha.
O que é
realmente uma “prosa” é apegar-se a idéias enferrujadas de antanho. Temos de
caminhar para a frente em busca de uma vida dedicada também a coisas outras que
não apenas comer, cagar e trepar para encher o mundo de tanta gente que nem
mais se pode parar na estrada para mijar porque as casas estão por toda parte.
Enquanto não
se aprender a usar a capacidade cerebral, não passaremos de manada. Inté.