Há um
livrinho aparentemente despretensioso, chamado Pequenas Histórias da Bíblia, escrito
por José Luís Olaizola, de leitura agradável e com fabulosas e divertidas ilustrações
feitas por Quino Marin, que realmente ilustram os textos, facilitando ainda
mais sua já fácil compreensão daqueles intricados assuntos da bíblia. A
juventude não faz ideia o quanto lucraria em trocar algumas pausas na futucação
do telefone pela leitura deste livrinho agradável. O livro dá uma ótima noção
de cultura bíblica e deveria ser lido para as crianças se seus pais tivessem o
sentimento nobre de se preocupar com o desenvolvimento espiritual de seus
filhos e se soubessem ler outra coisa que não estivesse relacionada a dinheiro.
A sabedoria que sempre esteva ao lado da paz não está do lado de pais que não
se preocupam em passar alguma sabedoria a seus filhos. O complexo de Rei Midas
tem infernizado a vida humana e assim será enquanto não for substituído pelo
bom senso de substituir por outras coisas o hábito pernicioso de correr atrás
de riqueza. Ler aquele livro e ouvir as músicas referidas na arenga anterior
produz um tipo de satisfação diferente de todos os tipos de satisfação a que as
pessoas estão acostumadas e que se relacionam geralmente com a aquisição de
algum bem material. Até mesmo o nascimento de uma criança foi transformado em
objeto a ser explorado pelo Mercado. Embora nada haja de intervenção divina no
ato da procriação, não passando tudo de arte da natureza, nem por isso deixa de
ser também um momento de enlevo espiritual porquanto a presença de um
recém-nascido de qualquer espécie desperta ternura. Não deve, portanto, o
nascimento ser transformado em motivo para compras em Me Ame. Em vez disso, a
preocupação deveria ser em torno de transformar a criança nascida num ser
verdadeiramente humano, portanto, diferente dos seres tidos como humanos, mas
que ainda são mais bichos que gente.
A
incapacidade de sentir momentos de enlevo espiritual é fruto da saudade dos tempos
de primatas. Não há outra explicação para o comportamento de pais que não só consentem
sejam seus filhos orientados para o mal, mas que também contribuem para que
isso ocorra no ambiente que não merece ser chamado de lar, mas apenas de casa
ou apartamento, porque não há sentido em se chamar de lar um pardieiro onde
cenas de assassinatos ao vivo e de prostituição sirvam de diversão para todos,
pequenos e grandes. Os adultos estão menos adultos do que uma criança esperta,
coisa sobre a qual o livro de que falamos faz refletir. Percebe-se isto nas
entrelinhas de uma parte da história que o avô de Ana contava e que se referia
precisamente à ação de Abraão ao expulsar Agar com o filho dele e dela por
ordem de sua esposa legítima, para o sofrimento no deserto. Não é realmente inaceitável
que um pai expulse uma mulher que lhe deu o filho tão desejado por ele,
mandando os dois para a morte quase certa? Pois, para os adultos, nada há de
estranho nisso porque Deus sabe o que faz.
Só os
juristas que perseguem o doutor Joaquim Barbosa serão capazes de dar nó na
interpretação destas palavras “Deus sabe o que faz” para que daí resulte o
entendimento que convença não se tratar realmente de desumanidade o
procedimento de Abraão. Embora para os adultos seja compreensível, a garota Ana
não perdoou e disse que Abraão era um molenga. Isso fez o avô lembrar a Ana a
necessidade de não se poder contestar as coisas da bíblia, e é justamente aqui
que está a causa de todo o mal do mundo que é a falta de curiosidade, zelo e
respeito pela vida, estado mórbido produzido pela religião ao castrar a
capacidade de pensar através do convencimento às pessoas de mente facilmente
domináveis de não ser necessário especular sobre os assuntos divinos. Com isso,
a mente enferruja e a capacidade intelectiva não sai do axé, do futebola, de
igrejas, de “famosos” e “celebridades”, todos adoradores do bezerro de ouro e
incapazes de um pensamento nobre.
Em várias
passagens dos contos a intervenção da menina questiona o que deveria despertar
nos adultos o mesmo questionamento não fosse a cegueira mental implantada pela
proibição de conhecer a ciência do bem e do mal. Esta proibição faz com que os
adultos aceitem sem nada questionar coisas impossíveis de acontecer pela falta
absoluta da lógica que rege a vida e que nos mostra ter sido a bíblia uma forma
que os ricos acharam de manter os pobres com medo do céu para que eles
trabalhem com o mínimo de custo sua terra e suas máquinas. Para a bíblia, há
grandes méritos na riqueza. Lá, Deus agraciou seus prediletos com muita
riqueza. Riqueza naquela época era constituída de terras e animais em vez de
moedas mostradas na revista Forbes. Na página 45 do livro, por exemplo, uma
bela ilustração mostra imenso rebanho de carneiro de Abraão quando partiu rumo
à terra que Deus lhe dera. Depois de passada a fase de criança, inocência e
questionamentos, fica no lugar uma falsa ideia de ser pecado dar asas à
imaginação, o que contribui para impedir o crescimento da inteligência e deixar
o pensamento voar livre.
A verdadeira
intenção da bíblia só pode ser percebida nas entrelinhas de suas linhas de
linguagem esquisita. A coisa é tão bem tramada que os adultos são convencidos
de se tratar de assunto do maior respeito, quando, na realidade, nada ali faz
sentido como estranhou a menina Ana ao ficar braba com Abraão. Pelo jeito,
seria mais prudente que as criançadas ainda não viciadas em futucar telefone
tomassem conta de administrar a sociedade. Inté.