terça-feira, 9 de janeiro de 2018

ARENGA 467


            A observação da vida leva à conclusão de que uma mentira repetida mil vezes tem a desvantagem de assumir foros de verdade. Mas o fato de ser considerada verdade não quer dizer que o seja. Continua sendo mentida e como tal convence de se estar procedendo corretamente, quando, ao contrário, procede-se erradamente. O fato de ter a vida dos seres humanos como paradigma duas grandes mentiras que acreditam serem verdades vem orientando-os de forma tão equivocada que eles produzem sua própria infelicidade em vez da comodidade indicada pelo pouco de sabedoria existente na natureza. Resultou em desassossego generalizado o procedimento humano orientado por duas grandes mentiras transformadas em verdade pela repetição transmitida de pais para filhos através das gerações. Uma destas mentiras é a promessa dos administradores públicos de organizarem uma sociedade justa com os recursos que seus membros lhes entregam para esta fim Outra grande mentira é contar com proteção divina. Da administração pública, em troca de muitos bilhões a sociedade é enganada com o mínimo necessário para conter a explosão que aconteceria se nada recebesse. Apenas migalhas e nada mais. Outra mentira que virou verdade de tanto ser repetida e transmitida de pais para filhos é Deus. O comportamento de esperar lisura dos administradores públicos na aplicação do erário trouxe ao caos proveniente da falta do dinheiro cujo destino a ninguém mais é dado o direito de ignorar porque a imprensa mostra diariamente o que é feito dele, enquanto que o comportamento de esperar de Deus alívio para os sofrimentos decorrentes da falta da aplicação correta dos recursos públicos, embora esperada desde que se tem notícia da existência das religiões, nunca veio nem nunca virá simplesmente por não existir Deus.

            É, pois, por ter seu comportamento fundamentado em duas mentiras transformadas em verdade que o ser humano é infeliz de uma infelicidade da qual nem sabe existir como evidenciam as festividades na juventude e tormentos depois dela em consequência de ter passado a vida inteira brincando e correndo atrás de dinheiro, sem ter tido um momento sequer de reflexão. Quando acontece de algum gato pingado parar para pensar, tais pensamentos versam sobre inutilidades como a preocupação em saber de onde viemos, para onde vamos, qual nossa finalidade no mundo. Enfim, apenas baboseiras, quando em primeiríssimo lugar a preocupação de todo aquele capaz de pensar deve ser no sentido de se viver de forma agradável, o que é inteiramente possível, dependendo unicamente de que os recursos produzidos pelos seres humanos sejam gastos visando tal objetivo. Entretanto, graças às mentiras tidas como verdades, não se percebe ser inteiramente inaceitável do ponto de vista do bem-estar social a existência das fortunas individuais mostradas à sobeja pela imprensa do mundo inteiro.

            Se a humanidade vai de mal a pior, tal fato se deve exclusivamente à falta de meditação sobre como ir melhor. Toda informação precisa ser examinada e reexaminada antes de ser aceita como verdadeira. Caso contrário, cai-se na mentira de ganhadores do Nobel de ser a competição a forma ideal para se viver em sociedade. A competição é uma invenção antissocial que deu origem à acumulação de riqueza num só lugar e miséria nos outros lugares. A sintonia fina da reflexão de Machado de Assis levou-o a dizer no conto A Igreja do Diabo que a economia tem por base a avareza. Portanto, a felicidade humana depende de uma juventude menos fácil de ser enganada que se ponha a refletir sobre a necessidade de pensar. Inté.

 

 

 

 

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