quinta-feira, 2 de agosto de 2018

ARENGA 508


Quando eu era menino, os filmes eram anunciados em cartazes amarrados nos postes de iluminação. Entre os colegas na escola primária da minha ainda insipiente cidadezinha de Itapetinga, então município de Itambé, para debochar (hoje “buling” em função do babaovismo do brasileiro com as coisas do estrangeiro) com um colega procedente de outra cidadezinha ainda menor que a nossa Itapetinga de metade do século passado, um dos nossos colegas mais inventivo dizia que viu lá na cidade desse outro colega um cartaz que anunciava da seguinte maneira as excelências de um filme de caubói: “Murro prá carái. Tiro como corno. Tá rebocado quem não ir”. Nunca consegui entender direito o significado de “tá rebocado”. Mas lembro que “estar rebocado” era ofensa. Como pensamento de velho não sossega, esta lembrança me foi trazida antes de sair da cama, ao ouvir pelo rádio um candidato a governador anunciar suas excelências sobre as inconveniências do oponente. Para o colega lá da escolinha, pensei, as campanhas eleitorais seriam mais ou menos assim: “Óia, cês tudo vota neu pruquê garanto lutá prá carái pelo bem docês tudo. Tanto os daqui como de quarqué lugá. Falô?”. O motivo da comparação é que as tais campanhas eleitorais têm a mesma falta de lógica das propagandas de bancos, do agribiuzinesse criador de fortunas e de cânceres, do consumismo, do mercado financeiro. É tudo armadilha visando explorar a estupidez humana. Embora ninguém mais acredite neles, os urubus, digo, os candatos, em torno da carniça, digo, do erário, dizem ter por objetivo o bem da população. Isto é tão ridículo quanto o banqueiro Henrique Meireles dançando forró. E não é menos ridícula a seriedade com que os papagaios de microfone entrevistam os pretendentes à chave do cofre. Perguntar-lhes como agiria em tal situação é de uma estupidez cavalar porque até mesmo um Zemané sabe perfeitamente que eles pretendem fazer isso aí que a Lava Jato está mostrando. A política nunca deixou de ser a arte de parasitar a massa bruta de povo ainda iludida com eleições. Está na imprensa que o banqueiro Henrique Meireles conta com sua eleição porque dispõe de milhões e milhões para gastar. Caberá à massa bruta de povo restituir estes milhões com os juros bancários. No tocante ao interesse público, com as necessárias e raríssimas ressalvas (felizmente), a palavra autoridades sempre mereceu ser escrita entre aspas. No O capítulo 21 do livro Cocaína, A Rota Caipira, de Allan de Abreu, intitulado Advogados do Crime, lê-se a seguinte passagem: “No fim dos anos 1980, um juiz federal de Campo Grande (MS) inocentou um traficante flagrado com 1,2 tonelada de maconha alegando que o laudo pericial não apontava se a droga era “macho ou fêmea”. Além disso, determinou a devolução do carregamento ao seu dono”. Agora, temos ministros da mais alta corte de justiça fazendo a mesma coisa com ladrões.

Se o funcionamento dos meios de comunicação não lhes permite interromper um minuto sua comunicação, pelo menos devem comunicar alguma coisa não tão imbecil quanto a nojeira das campanhas eleitorais, principalmente sobre as de países estrangeiros. Absolutamente nada pode justificar arrancar bilhões do lombo da massa bruta de povo para gastar em eleições enquanto falta dinheiro para coisas essenciais. Entretanto, a papagaiada de microfone, passando ao largo de assuntos que dizem respeito às causas da esculhambação, tergiversam inutilmente em torno de coligações, candidatos à excrescência da figura inútil de um vice para aboletar-se em palácio e ser motivo para mais falatórios inúteis. Tá, ou não tá precisando mudar tudo? Pior é que esta estupidez não está apenas nas sociedades primitivas como a nossa, ainda de braços dados com o regime colonial. Também as sociedades tidas como civilizadas estão mal e a pedir a mudança que inevitavelmente virá malgrado a má vontade da papagaiada de microfone que a soldo dos Reis Midas do mundo fazem de tudo para eternizar a insustentável cultura da competição. Denigrem o socialismo acusando-o de assassinatos, mas escondem a realidade de inexistir um sistema político ideal uma vez haver infinitamente maior número de assassinatos decorrente da competição que leva a sociedade à violência que é a marca registrada tanto no socialismo quanto no capitalismo que o babaovismo garante ser o ideal.

A História mostra, pelo menos no entendimento de quem é de poucas letras, que as várias mudanças ocorridas não aconteceram porque pessoas se reuniram e disseram “VAMOS MUDAR!”. Ninguém disse “VAMOS FAZER FOGO!”, “VAMOS INVENTAR A AGRICULTURA, A RODA, DOMESTICAR ANIMAIS, A ATIVIDADE COMERCIAL, O MERCADO OU O CAPITALISMO”. Apesar disto, aconteceram, e acontecerem em função da tendência natural de evoluir que leva o ser humano à ação quando premido por incômodo que dá origem à necessidade de mudança, necessidade esta que sempre existiu e que provocou várias mudanças, todas inócuas uma vez que o desassossego nunca deixou de fazer parte do cotidiano em virtude de viverem os humanos a grande fantasia do desconhecimento da realidade da vida ao acreditar não ter fim o vigor da juventude. Tendo se tornado insustentável a cultura da competição, algo diferente haverá de substituí-la. Sendo o conhecimento cumulativo, isto é, o conhecimento adquirido facilita a aquisição de mais conhecimento, o que pode ser constatado ao se verificar que à medida em que se executa determinado trabalho a facilidade de executá-lo aumenta na proporção das repetição de sua execução, a acumulação de conhecimentos, do mesmo modo, levará inevitavelmente à conclusão de haver forma menos estúpida de se viver. Da mesma forma como os grandes escritores começaram tomando conhecimento do nome das letras, do mesmo modo como toda caminhada por maior que seja começa pelo primeiro passo, o caminhar no rumo de uma vida melhor, embora lentamente, prossegue. O desalento em torno das eleições mostra que até mesmo seres quase irracionais como os da massa bruta de povo foram levados à percepção da falsidade que as envolve. Também facilmente observável é que da acumulação de conhecimentos tem resultado em que as mudanças ocorram com maior celeridade. Esta é a razão pela qual a pré-história durou mais que a primeira fase da história, que durou mais do que a segunda, que durou mais que a terceira, que durou mais que a quarta e última, esta em que vem a humanidade aos trancos e barrancos se arrastando até os dias atuais numa vida que em nada difere da vida das feras.

 O grande erro dos seres humanos vem sendo repassado de geração a geração. Consiste em que aqueles que por esse ou aquele motivo vieram a se encontrar em situação considerada privilegiada em relação aos demais seres humanos, eliminando com tal comportamento a igualdade tão falada nos tratados internacionais. É verdade que em função da brutalidade humana é impossível a igualdade absoluta. Entretanto, uma vez que os seres humanos são obrigados a viverem em sociedade,  em nome da sociabilidade, pois, não há de ser tão grande a desigualdade, razão pela qual pecam fragorosamente contra si mesmos aqueles que sempre se opuseram a qualquer tipo de mudança em função da cultura contrária à cooperatividade necessária à vida coletiva. A cultura da competição é responsável por todos os males da humanidade por ser impossível uma sociedade na qual uns membros vivem tomando de outros membros da mesma sociedade as coisas de que necessitam sem levar em consideração que os usurpados necessitam também daquilo que lhes é tomado. Esta realidade é visível. Aparece, por exemplo, na notícia no Jornal do Brasil de que o lucro dos bancos (R.$28,8 bilhões ao ano) é quase a metade do montante que atenderá as necessidades de trinta e nove milhões de famílias no programa Bolsa Família. Isto justifica plenamente o que disse o historiador de ser o ser humano uma criatura estúpida. Se nas sociedades humanas mais adiantadas no ainda insipiente processo de civilização, aquelas nas quais é menor a desfaçatez da indiferença quanto ao bem-estar coletivo, ainda guerreiam ente si, este fato demonstra não terem as sociedades tidas como civilizadas alcançado ainda a evolução espiritual capaz de viverem a paz de que tanto falam. Que dizer, então, das sociedades mais atrasadas? Pode-se dizer seguramente que ainda não deixaram a pré-história.

Embora os meios de comunicação procurem evitar a todo custo, é sumamente necessário pensar sobre estas coisas. As criancinhas precisam que seus pais se inteirem do porquê de girarem as notícias na imprensa em torno de brutamontes semianalfabetos e completamente ignorantes de sociabilidade considerando-os “famosos” e “celebridades”, ou em torno de bundas, doutores bumbuns, langerries, enfim, em torno de baixarias. Por trás disto estão as Forças Ocultas representadas por infinita papagaiada de microfone empenhada em fazer crer que brincadeiras são mais importantes que assuntos do tipo dos assuntos tratados aqui, embora de forma risível para os intelectuais que escrevem calhamaços enfadonhos versando sobre o que é, mas sem uma palavra sequer sobre o porquê de ser assim e muito menos sobre como deve ser. O último desperdício de meu pouco dinheiro com estas inutilidades foi a compra do livro A Elite do Atraso do intelectualíssimo Jessé de Souza. O atraso é notório. Se os intelectuais estivessem realmente interessados num tipo de vida menos estúpida deveriam se ocupar em buscar o porquê de tamanho atraso humano capaz de justificar a existência dos morticínios comuns na história da vida dos homens, inclusive em nome da figura imaginária de Deus. Mas, não. Gastam sua intelectualidade mostrando o que está à vista de todos. Pior ainda são os intelectuais que dizem ser esta a melhor forma de se viver, quando é palpável a realidade de ser esta fase histórica conhecida por Contemporânea tão insustentável quanto as duas que a precederam e cuja insustentabilidade as levou a sucumbir por se fundamentaram na existência de exploradores e explorados como acontece agora na mesma intensidade e de forma ainda mais desumana. Mais desumana ainda porque de tal modo disfarçada que os explorados agradecem a Deus quando conseguem um emprego que os explore até restar um caco choroso no corredor do hospital.

Embora desde séculos antes de Cristo o imperador Ciro, por meio do Cilindro de Ciro, condenasse o procedimento de exploração de seres humanos por outros seres humanos, tal exploração nunca deixou de existir. Alguma forma menos desinteligente de viver, para o bem das criancinhas que mães ignorantes lançam no mundo, não  deverá jamais deixar de ser procurada. Inté.

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