sexta-feira, 13 de março de 2015

ARENGA 98


Notícia de jornal: Estudantes enfrentam longas filas para tentar financiamento em faculdade de São Paulo.

É preciso tergiversar um pouco antes de falar sobre as implicações desta notícia, e vamos começar esta tergiversação pelo seguinte verso: “Por que não viver esse mundo, se não há outro mundo”, dito pelo poeta com absoluta certeza de estar certo, como realmente está. Mas, será que viver este mundo da forma como se vive é uma boa forma de se viver? Uma vez que não outro lugar para se viver, o correto seria fazer deste um lugar agradável como faz gente quando vai procurar um imóvel para morar. Povo, com certeza, não faz exigência nenhuma porque povo não sabe que barulho faz muito mal à saúde, não sabe que esgoto a céu aberto mata as crianças, não se incomoda com a presença de barata e ratos. Como o número de povo é infinitamente superior ao número de gente, a vida não pode ser agradável e o país é mais dos estrangeiros do que nosso. Aqui por estas bandas as igrejas e as festas nos diversos terreiros de brincadeiras parecem anunciar só felicidade. Entretanto, para conhecer a realidade da vida deste provo festejador não é preciso mais nada do que assistir os programas Brasil Urgente e Cidade Alerta. Nada mais entre nós corresponde à realidade. Tudo é fantasia e festa. As pessoas mais valorizadas são na realidade as que menos valor tem. A hipocrisia, a burrice, o espírito de rato e a mediocridade se tornaram nossa característica. A despedida da morta Inezita Barroso foi aproveitada mediocremente para fazer propaganda de um cantor de bobagens cujo nome aparecia destacado numa rudia de flor depositada junto ao caixão. Esta mediocridade mental não permite a quem ainda não é gente perceber que naquela notícia do jornal citada lá em cima está a causa de toda a desarrumação que transforma em esculhambação o que devia ser uma sociedade. Como para entender o que quero dizer é preciso pensar, aqueles pobres estudantes da notícia não podem ainda entender a afirmação de ser desnecessário o sufoco de enfrentar fila na madrugada fria e chuvosa a fim de conseguir financiamento para estudar, dinheiro esse que o também ministro da fazenda, tão frio quanto a madrugada chuvosa, talvez um dos bonecos egressos de alguma universidade famosa, cortou como uma das medidas de ajustar a diferença negativa entre o dinheiro que tem o governo e o que ele precisa ter para desperdiçar mais do que gastar cuidando da sociedade. E o pior de tudo isso é que muitos daqueles jovens pobres de espírito que imploravam pelo empréstimo já o obtiveram antes e estão cursando a faculdade, ficando, assim, numa situação esquisita porque o retorno do dinheiro já recebido é para ser feito com o dinheiro ganho no exercício da profissão. Se não se formar por falta do restante do financiamento, como poderão cumprir a obrigação de efetuar o pagamento? E por que isto acontece? Exatamente porque aqueles jovens são povo e por isso não pensam. Se pensassem, haveriam de concluir não haver necessidade de pagar para estudar porque isto é um direito garantido e sacramento como sendo obrigação do Estado. Se se tratasse de gente, os pais daqueles jovens enfileirados no frio, na chuva, na fila, teriam ido ao governo e exigido com energia e polidez o cumprimento do dever constitucional de fornecer o estudo já custeado pelos impostos, propondo-se, inclusive, a ajudar o governo a fiscalizar o erário.

O fato de haver jovens querendo passar da condição de povo para a condição de gente, como prova a existência da união de jovens ateus, que também desejam um mundo agradável para as criancinhas que dirigem os carrinhos de supermercado e as que pedem esmola, dou uma dica esperta que será um tremendo empurrão para ajudar a atravessar a ponte que separa o mundo de povo do mundo de gente. Esta dica consiste em futucar seu aparelho para ver coisa diferente de notícia sobre o resultado do exame de urina do jogador de futebola. Em vez disso, peça ao amigão Google o seguinte: “preambulo da constituiçao brasileira” e soletrar o pequeno texto até conseguir ler. Depois de conseguir ler, esforçar um pouco para conseguir entender. Depois de entender, aí, sim, estará ingresso na qualidade de gente. Para quem nada sabe, qualquer Zemané pode ser professor. Assim, proponho pensar junto com os possíveis interessados no aprendizado que leva à condição de gente. Em primeiro lugar, como quem não pensa pensa que a coisa mais importante é Deus, está dito lá no fim do preâmbulo pelo pessoal que fez e aplica a constituição que eles agiam sob a proteção de Deus. Como não cumprem o que a constituição determina, estão procedendo em relação à confiança de Deus do mesmo modo como os desobedientes israelenses a ignorar as recomendações divinas e a esquentar a moringa de Moisés no deserto, lugar onde já existe muita quentura.

Por uma questão de respeito aos que se inclinam para o lado do conhecimento, tratei primeiro da proteção divina por ser de suma importância para quem ainda não sabe que pode pensar. Para quem sabe, entretanto, o mais importante de todas as promessas não cumpridas da constituição é o de assegurar o bem-estar social porque onde existe bem-estar é porque não está faltando nada. Não estando faltando nada é porque está todo mundo de barriga cheia, despreocupado porque nada ameaça sua segurança em todos os aspectos, situação em que se pode garantir haver bem-estar. Assim, aos poucos, os jovens interessados perceberão a irrealidade em que incorre quem alega respeito à constituição. Em razão de sua inobservância é que há necessidade de implorar pelo desnecessário financiamento para pagar uma coisa que já está paga. Com o maior dos convencimentos pode-se afirmar que sem pensar não dá para ser diferente de manada. Inté.  

 

 

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