terça-feira, 7 de abril de 2015

ARENGA 102


Certa vez recorri à única instituição que reúne uma juventude de se botar fé: o MINISTÉRIO PÚBLICO. Antes disso, descobri coisa do arco da velha procurando saber o que a legislação diz a respeito do barulho, uma vez que eu queria pedir àquele órgão que com muita justiça se faz acompanhar da qualificação de “douto” porque o sentido dessa palavra inclui a noção de “grande sabedoria”, qualidade presente em jovens que batalham para organizar uma sociedade honrada, mesmo se arriscando a contrariar interesses mafiosos inseparáveis do sistema capitalista e sua sede de riqueza responsável pela criação de muitas infelicidades. O certo é que para me dirigir a tão nobre instituição pesquei por meio do amigão Google alguma coisa do que diz a legislação sobre a poluição sonora, e pedi que a promotoria obrigasse nossa prefeitura a cumprir seu dever de nos livrar do inferno provocado pelos vários tipos de veículos portando alto-falantes a todo volume. Descobri que cientistas da ONU afirmam decorrerem do barulho, além de outros males, o envelhecimento precoce e impotência sexual. Embora nas entrelinhas da declaração pode-se ler não se tratar de espírito de solidariedade humana, mas tão somente evitar gastos com a saúde dos frequentadores de igrejas e terreiros de brincadeiras de todo o mundo, com o que diminui a possibilidade de inadimplência das prestações mensais de suas compras através das quais se fazem as riquezas a serem enviadas para os infernos fiscais. A ONU recomendou a todos os governos do mundo a dar prioridade ao combate à poluição sonora em virtude dos graves danos à saúde dela decorrentes. Se eu fosse a ONU, eu escreveria em todos os muros do mundo a necessidade de dar prioridade urgente urgentíssima (sem ser de brincadeirinha) ao combate à ignorância por decorrerem dela todos os outros males, inclusive o barulho. Basta uma olhadinha nas lojas para se perceber que as mais barulhentas são as preferidas da manada, razão dos alto-falantes que atraem povo como açúcar atrai formiga. Ao lado da recomendação para combater a ignorância, eu acrescentaria que Rui Barbosa aprendeu e nos ensinou que a ignorância é a mãe de todos os males do mundo, expressão que expõe uma realidade infelizmente desconhecida do povo porque povo não é ainda gente, não pensa, não lê nas entrelinhas, onde se esconde a verdade.

O oba-oba em torno da excrescência social da redução penal para dezesseis anos é uma espetacular evidência da veracidade da afirmação de Rui Barbosa. É um mal digno do inferno, decorrente da mesma ignorância que levou o pobre diabo espiritual a mostrar onde estava escondido o Lamarca, em troca do dinheiro para comprar um burro novo prá sua carroça. Outra demonstração de ignorância foi o apoio que os frequentadores de igreja e de axé deram ao movimento militar de 1964 que matou vários jovens, inclusive um grande amigo meu cuja única maldade era querer menos injustiça social. O projeto aplaudido pelos meios de comunicação que pensam pelo povo e que o leva a agir contrariamente aos próprios interesses para agir a favor dos interesses deles, dos meios de comunicação, visa tal projeto atender ao interesse dos ricos donos do mundo em dar sumiço no excedente de pobres necessários para ligar os motores das indústrias. O projeto de meter crianças em cárceres imundos onde serão vítimas das mais torpes brutalidades e doenças que pais nenhuns admitiriam para seus filhos só trará malefícios por se tratar da fracassada e retrógrada política de combater a violência com truculência em lugar da sabedoria que ensina ser o convencimento o mais eficiente dos meios de se criar um comportamento. Se pessoas são convencidas de ser beleza pura para Deus ver cepar fora a cabeça de outra pessoa ou mesmo a própria, muito mais fácil é convencer uma criança a ser cidadã.

Nas entrelinhas dos pronunciamentos sobre a necessidade de meter na cadeia esses moleques, está o conluio baseado na monumental ignorância referida por Rui Barbosa. Os politiqueiros passam a aparecer nos meios de comunicação como agindo em benefício da tranquilidade, com o que garante o voto da turba que não sabe que pode pensar, enquanto que os meios de comunicação se veem livres do excedente de pobres. Aí se fecha o círculo da maldade desse sistema desumano de vida.

Filhinhos de papais do tipo “sabe com quem está falando?” em seus sofisticados e luxuosos automóveis dirigidos por bêbados e em alta velocidade matam os frequentadores de igreja, e, como consequência, em vez da cadeia, tem aumentadas suas qualidades de “famosos” e “celebridades” festejadas por esse mesmo populacho que quer ver nas masmorras as pobres crianças pobres. Ouvi no boteco que um destes garotões tidos por “celebridades” foi barrado na entrada de um clube pelo porteiro. Com a empáfia dos arrogantes, perguntou ao porteiro se ele sabia quem era o seu pai, ao que o porteiro respondeu que se nem mesmo a mãe do garotão grã-fino sabia quem era o pai dele, como poderia ele, o porteiro, saber? A realidade é que o congresso que vai votar a medida monstruosa é formado por criminosos, segundo a imprensa, e religiosos acostumados com a matança bíblica de crianças, e por isso certamente será aprovada a medida monstruosa em todos os sentidos. Os frequentadores de igreja e campo de futebola certamente retrucariam que se levar essa criança de dezesseis anos à escola ela mataria a professora no primeiro dia de aula, o que é verdade. Mas é verdade também que estas crianças cometem crimes porque foram criadas como bichos abandonados à própria sorte. A criança que mataria a professora, na verdade, só tem o aspecto de criança. No lugar da espiritualidade que caracteriza e orienta quem convive com gente, estas crianças são orientadas apenas por instinto. É por isso que ela mataria a professora, do mesmo modo como o faria um cão raivoso. O comportamento aos dezesseis anos reflete o aprendizado dos tempos de cueiro, tempos em que as crianças que os religiosos como Datena querem meter na cadeia, em lugar do bê-a-bá, aprendiam a roubar para comer. Quando eu era vaqueiro, acontecia de uma vaca rejeitar o bezerro. Nós cuidávamos de alimentá-lo e protegê-lo até saber se virar e tomar conta de si, com o detalhe de que o garrote em que se transformou o bezerro abandonado não precisava comprar nada. Caso ele só pudesse viver se fosse obrigado a comprar capim e água, aí nós teríamos também a obrigação de providenciar para que não lhe faltasse o dinheiro do qual dependia sua vida. A forma irresponsável de administrar a riqueza pública é a causa da falta de condições para cuidar das crianças rejeitadas. Sendo a sociedade responsável pela escolha dos administradores irresponsáveis, a sociedade é diretamente responsável pela situação destas crianças, razão pela qual se configura a punição da vítima no lugar do causador do dano. Os gestores públicos escolhidos pela malta ignorante de que se constitui a sociedade, e que elege palhaço para senador, tem como única atividade construir bueiros por onde escoar o dinheiro fazer daquelas crianças grandes seres humanos em vez de raivosos e perigosos como feras. Os estrangeiros, que conhecem mais o Brasil do que os brasileiros, publicaram no jornal “The Economist” um escândalo ainda maior do que o Lava Jato. O assunto mereceu matéria do jornal do Brasil e dá conta de que a Polícia Federal executa agora a operação Zelotes no encalço de mais dezenove bilhões surrupiados do Conselho Administrativo de Recursos Financeiros. Coisa reveladora da situação degradante em que se encontra nossa sociedade é o fato de ter o Jornal do Brasil perguntado onde se encontrava a repulsa da sociedade brasileira, resposta que está lá dentro do mesmo jornal dando noticia de que a Via Sacra levou multidão à Rocinha. É nas igrejas e nos campos de brincadeira os lugares onde está o povo, e sua indignação só acontece quando algum espetáculo de dança ou oração é cancelado. Desse modo, com tal mentalidade, jamais perceberá que a ideia da redução da maioridade penal é uma grande maldade e indiferença ante a figura inocente da criancinha que vai deixar de ser criança no inferno de uma cadeia. A tudo isso falta ajuntar a hipocrisia que leva a uma ocorrência que mencionei nesse arremedo de blog há muito tempo e que se refere a duas senhoras conversando sobre o desrespeito que era um lugar aqui em nossa cidade onde as crianças se reuniam para consumir droga. Em resposta a esse comentário da primeira senhora, a segunda senhora respondeu que eles eram os culpados pela situação em que se encontravam por terem usado errado seu livre arbítrio. É com esta indiferença e ignorância de sociabilidade que os enchedores de igrejas, terreiro de brincadeiras e latrinas se referem a estas infelizes crianças que se cuidadas não teriam nenhuma diferença das que fingem dirigir o carrinho no supermercado, como também não há diferença entre o cadáver de uma criança pobre morta pela polícia e uma criança rica morta pela natureza. Se houvesse inteligência na natureza ela não colocaria no lixão uma criança amada por Cristo. Tá faltando juízo pelaí, nuntanão? Inté.

 

 

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