segunda-feira, 1 de maio de 2017

ARENGA 415


Tive oportunidade de presenciar um espetáculo que mostra a mediocridade da vida humana melhor do que qualquer trabalho dos teatrólogos mais eminentes. Embora avesso a solenidades, não pude recusar o chamado para ser padrinho do casamento de um sobrinho a quem sou afeiçoado ainda mais por questão de empatia do que de parentesco. Amargurei momentos de extremo mal-estar diante de tantas mediocridades a título de filosofia proferidas pelo também jovem celebrante da união matrimonial de meu sobrinho à sua bela noiva. O pobre “filósofo” afiançava aos noivos que um pertenceria ao outro de forma tão inseparável e perfeita como aquela aliança que ora colocavam em seus dedos, de forma que na união entre os dois deveria haver a mesma perfeição existente na continuidade daquele arco. Também disse que o que Deus une nada pode separar. Entretanto Deus uniu Adão e Eva ao Jardim do Éden, mas a serpente os separou de lá. Numa verborreia nauseante, o pobre mendigo espiritual que filosofava a troco de pagamento afirmava que a mulher passava a pertencer ao marido e o marido à mulher. É possível alguém pertencer a alguém? Onde ficaria a afirmação de liberdade defendida por Locke, Voltaire, Rousseau, e tantos filósofos que não filosofavam em troca de pagamento, mas por amor à sabedoria e à arte de pensar? Abandonei a cerimônia por não mais suportar tanta mediocridade e tristeza ao constatar a sinceridade com que as demais pessoas prestavam atenção à verborreia emanada daquele estelionatário espertalhão cujos crimes de estelionato levaram-no a ser proprietário de uma igreja. O artigo 71 do Código Penal pune o ato de se enganar alguém a fim de tirar proveito, denominando tal procedimento de estelionato, herança do Direito Romano que ligava este comportamento antissocial à palavra "stelio" (camaleão) que engana suas presas com grande poder de camuflagem.  
Aquele espetáculo lembrava o significado do Mito da Caverna usado por Platão para mostrar o quanto é difícil fazer ver a verdade a quem está convencido da mentira. O mendigo espiritual que celebrava o casamento do meu sobrinho estimado atribuía a Deus a responsabilidade pelo sucesso do vínculo matrimonial, quando, na verdade, depende unicamente da vontade dos noivos em formar uma sociedade estável. Sendo próprio do ser humano a necessidade de companhia, além da atração sexual responsável pela perpetuação da espécie, o sucesso do casamento depende exclusivamente da forma como homem e mulher encaram o relacionamento mútuo decorrente da união que assumiram. O sucesso da união entre os dois depende mesmo é de pautarem suas vidas pela sinceridade, começando pelo reconhecimento de se tratar de duas vidas, e não de uma vida só como prega a filosofia barata de embusteiros e sua frajolice de amor eterno. Depende a duração da união muito mais do aspecto material do que a baboseira do “só vou se você for” dos momentos iniciais. Embora sejam extremamente gostosos os momentos de enlevo, eles não duram muito e é inteiramente impossível evitar que o jovem ou a jovem sintam atração física ou espiritual por outra pessoa. Portanto, faz mais bem feito o casal que dispensa a filosofia comprada de filósofos que filosofam por dinheiro e engendrarem sua própria filosofia que deve encarar com realismo o lado material dos rendimentos de que dispõem e as despesas que precisam fazer. Na mais das vezes os jovens estão acostumados à mesa e cama da casa de papai e mamãe, e de momento para outro se depararão com a realidade das compras. Desse modo, deve ser desprezado o aspecto grosseiro do assunto dinheiro, botar as cartas na mesa e combinar a participação de cada um nas despesas a serem atendidas, no caso de ambos recebem pagamento. Outra coisa sumamente importante é não omitir comportamentos anteriores que podem trazer alguma decepção para um ou para outro, assuntos que seriam melhor tratados logo no começo do namoro de todos os namorados. Outra coisa importante é a questão do ciúme. Os dois recém casados devem conversar francamente sobre duas situações: uma é aceitar tranquilamente as famosas “escapadas”. Outra é ser forte o bastante para ignorar os apelos nesse sentido, caso em que o macho e a fêmea terão de se contentar inexoravelmente em não levar em conta as fantasias sexuais, o que será recompensado pelas vantagens reais do amparo mútuo e sincero que muito benefício, conforto e segurança dá quando chega o cansaço da vida.

Enfim, o sucesso da união matrimonial depende da mesma coisa de que dependem todos os tipos de sociedade: VONTADE DE PERMANECER EM SOCIEDADE. Tão simples assim. Inté. 

 

 

 

 

 

 

 

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