quarta-feira, 28 de maio de 2014

ARENGA TRINTA E QUATRO


De curto conhecimento, não sei se alguém disse antes o que disse Rui Barbosa ao afirmar ser a ignorância a causa de todos os males que afligem a humanidade. Pela quantidade de males, dá para perceber o tamanho da ignorância em que mergulha humanidade. Olhando prá ela de cá do alto do décimo andar, veem-se coisas do arco da velha. Ali, por exemplo, estão homens se internando num hospital, ocupando a vaga de doentes, apenas para que aparelhos eletrônicos produzam em seu corpo a mesma dor que a fêmea sente para nos trazer ao mundo. Mais adiante, constata-se ainda existir reis no século vinte e um, e um povo aplaudindo um nobre príncipe que depois de tomar umas e outras comprou o boteco onde ficou de fogo. Acolá podemos ver multidões encantadas com outros idiotas que passam raspando seus narizes dirigindo a trezentos quilômetros por hora, e outras multidões com a cara para cima onde aviões fumacentos passam zunindo sobre suas cabeças vazias, enquanto outras multidões vibram com a sena macabra de dois indivíduos se destruindo mutuamente como faziam os gladiadores, resultando disso que muitos homens ainda em idade produtiva são inutilizados em consequência das bordoadas que levou no escutador de novela. Pode-se ver também a produção de alimentos ser transformada em negócios e negociatas envolvendo um tal de agribiuzinesse e o BNDES, cujo resultado é produzir mais riqueza do que a comida que, apesar de ser muita, é envenenada. Ali à direita, estão pais orientando os filhos para que eles se chicoteiem até sangrar seus corpinhos ainda em formação para com isso agradar a seu Deus. Também pode ser vista com horror uma sociedade cujas famílias incentivam suas filhas à ingressarem nas várias formas de prostituição milionária que inclui leilão de xoxota e programas como BBB e Fazenda. Mais à esquerda, vemos uma riqueza fabulosa, suficiente para acabar com a miséria no mundo, desperdiçada na construção de caríssimos e monumentais templos religiosos e uma plêiade incontável de parasitas assalariados para representar os problemas dos povos nos tribunais celestes e transformar em santos a lembrança de pessoas que doaram sua vitalidade à prática inútil da caridade que só beneficia aos que embolsam o dinheiro de evitar a necessidade de caridade. Mais pracolá, vê-se um país chamado América no Norte, onde vive um povo tão apegado com seu Deus que declara sua fé nas cédulas do dinheiro pelo qual devota o mesmo apego, mas que, ao mesmo tempo, joga bombas sobre criancinhas e as dilacera para tomar o dinheiro de seus pais. Já daquele outro lado, está um povo esquisito com rudia de pano na cabeça, liderado por homens que arrebanharam só para si todo o dinheiro do petróleo da região, e como não sabem o que fazer com tanto dinheiro, estão fazendo edifícios usando o próprio dinheiro como material de construção, deixando prá trás o rei Salomão que construiu usando o suor de escravo. Há, bem mais ali, um negócio chamado Economia Política que é a maior safadeza do mundo. É um troço de tamanha malandragem que aproveita a necessidade que todo mundo tem de adquirir alguma coisa, para forçar todo mundo a adquirir muito mais coisas do que realmente necessita, o que é uma grande perversidade fazer de bobo quem poderia ser sábio sem a indução maligna de inumeráveis papagaios papagaiando através de microfones cujo barulho lá nos auto-falantes conduz as pessoas para as lojas também barulhentas, do mesmo modo como o berrante conduz a manada. Enfim, é tão triste o que se vê lá embaixo que vou fechar a janela. Pior é que tem tudo na televisão. Felizmente, também tem programas sobre os bichos, cujo comportamento demonstra ser menos bobo e sem sentido do que o comportamento dos humanos, e, além disso, também temos o Alienista prá reler.

Se tanto se fala em tranquilidade, por que há tanta intranquilidade no mundo? Por duas razões apenas: Uma é que a humanidade está dividida em duas espécies de seres humanos cada uma delas portando um defeito hereditário que induz a dois comportamentos ambos incompatíveis com a existência de uma sociedade agradável. Estes dois comportamentos são os únicos responsáveis pelas coisas estúpidas que espiamos lá de cima pela janela. Sendo um desses comportamentos orientado pela religiosidade, impossibilita o conhecimento necessário de sociabilidade porque o religioso nada sabe além de religiosidade e a religiosidade, que é unha e carne com a política, ensina não haver necessidade de elevar a mente à capacidade de pensar e raciocinar que é para moldar o comportamento que faz acreditar ser a vida uma eterna festa promovida por “celebridades” e “famosos”, resultando naquelas coisas vistas lá da janela.

Sendo o comportamento da categoria que integra a segunda parte da humanidade orientado pela usura, fica, do mesmo modo, impossibilitada a criação de uma sociedade agradável porque os usurários só aprendem as coisas relacionadas ao ajuntamento de dinheiro, o que demonstra ser o comportamento do usurário, como o do religioso, também incompatível com uma sociedade agradável. Ao contrário, a prática anti-social de acumular riqueza, objetivo único do avaro, prejudica a sociedade porque a riqueza guardada lá dentro falta cá fora.

O desconhecimento do comportamento adequado para se viver bem em sociedade, presente nas duas espécies de gente que integram a humanidade, portanto, são a ignorância sentenciada por Rui Barbosa. Dá-se o nome de ignorância à falta do conhecimento sobre determinado fato em virtude da falta de oportunidade de contato com o aprendizado daquele fato. É como o sujeito que chega numa cidade pela primeira vez e ignora tudo por lá. Desse modo, tanto o avarento quanto o religioso, qualidades negativas encontradas muitas vezes na mesma pessoa, ignoram completamente os procedimentos dos quais resultam uma sociedade agradável, uma vez que sua mente foi educada exclusivamente para acreditar que apenas a riqueza e a religião são importantes na vida, vivendo assim num mundo de enganosa e perigosa fantasia.

Os avaros impossibilitam a paz social quando retém em seu poder uma riqueza infinitamente maior do que o necessário para se viver bem. Esta riqueza vai fazer falta em outro lugar. Do mesmo modo, também os religiosos impedem a paz social porque são convencidos da desnecessidade de analisar as informações recebidas, reduzindo a nada a função do raciocínio diretamente ligada à elevação espiritual sem a qual não se passa de bicho. Espero ainda ter tempo de abrir a janela e ver a pensar as pessoas com aqueles comportamentos desastrosos. Custa nada sonhar, Né não? Inté.

 

 

 

 

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