domingo, 27 de março de 2016

ARENGA 246

Desde tempos remotos até à atualidade a existência do universo envolve misteriosidade, sendo a vontade divina a explicação incontestável para os mais ignorantes (a absoluta maioria dos seres humanos), explicação refutada pelos cientistas. Na religiosidade os analfabetos sabem mais do que os intelectuais. Escapa-lhes a ação transformadora da natureza. Como os sapatos, estão certos de que tudo foi feito por alguém. Não lhes passa pela mente tacanha que a partir desse princípio haveria necessidade haver uma entidade anterior que fizesse o seu Deus. Embora seja inegável haver algum desenvolvimento mental, ele é tão lento que ainda não permite compreender que as divindades surgiram da necessidade de proteção que sentiram os primeiros seres humanos ante a fúria da natureza. Sentindo-se impotente ante tanta força, o homem imaginou uma força ainda maior sob a qual se sentir protegido. Sendo o lado material da existência mais exigente do que o lado espiritual, os homens se lançaram com todas as energias à dificílima tarefa de sobreviver, de modo que seus pensamentos giravam apenas em torno de abrigo, comida, bebida, sexo e adular o ser misterioso que inventaram, o que limitou a mente, limitação que vem sendo passada de geração a geração séculos após séculos. Construíram-se imensas casas por todo o mundo para onde os pais levam seus filhos, os filhos levam os netos deles, e estes levam os bisnetos que levam os tetranetos, num interminável aprendizado de mentiras. Estivessem as crianças aprendendo verdades o mundo não estaria sendo destruído e isto devia ser o suficiente para que os jovens quebrassem esta cadeia fonte de infelicidade e ensinassem a seus filhos que a forma de administração pública é a única responsável pela tranquilidade espiritual de que tanto carecem. Fizeram um livro chamado bíblia sobre Deus, cuja leitura mostra ser exatamente o contrário daquilo que dizem ser Ele. Em lugar da bondade na qual se acreditam os ridiculamente chamados fiéis, carneiros, ovelhas, servos, palavras todas de sentido humilhante, a bíblia mostra um Deus que mata e é escravagista (Gênesis 17:12; Êxodo 21:1-11-20-21; Levítico 25:44-45-46). Há cerca de dois mil e quinhentos anos deu na telha de uns sujeitos denominados filósofos pré-socráticos desconfiar da explicação da criação divina e passaram a especular sobre o assunto. Como os pensamentos continuassem e continuam ocupados exclusivamente com o lado material da vida, raros são aqueles que se dedicam a pensar, de modo que a humanidade inteira ainda está convicta da criação divina. A realidade continua tão distante do povo quanto distante estava dos habitantes da caverna que Platão.
Para tomar conhecimento do engodo que é a religiosidade é preciso afastar-se do fanatismo de não haver necessidade de contestar nada que dela provém. Para tanto não é preciso debruçar sobre livros escritos por intelectuais cujo linguajar erudito escapa a nosoutros que não fazemos parte da aristocracia literária. Para se começar a encontrar algo de estranho na religiosidade é suficiente observar que nos ambientes de menor esclarecimento e de maiores dificuldades materiais são aqueles onde a religiosidade é mais presente. Permanecer em erro tanto é ridículo quanto nocivo. Faz-se necessário cair na real e deixar de desperdiçar recursos monumentais a fim de se realizarem cerimônias destinadas ao relacionamento com entidades divinas. As futuras gerações vão dar boas risadas com a palhaçada de lavar e beijar um o pé de mendigo em vez de se evitar a existência deles. Transformar em divindade a lembrança de alguém, então, é o cúmulo da infantilidade. Vamos amadurecer, crianças. Inté.
 


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