No livro
Justiça, Editora Civilização Brasileira, Michael J. Sandel narra um episódio
que mostra com perfeição a monstruosidade desse tal Livre Mercado, que apesar
de ser uma barbárie em termos de vida em sociedade, é endeusado por economistas,
estas criaturas de um Fiat satânico emitido pelas Harvards do mundo que, por
sua vez não são mais do que lavanderias de cérebros tão eficientes que anula a
personalidade de quem as frequenta e os torna lambe-botas dos Reis Midas do
empresariado de avareza tão brutal quanto incontida. A observação do autor do
livro gira em torno da polêmica a que deu origem à exorbitância dos preços
cobrados pelos produtos demandados por pessoas aflitas em consequência do furacão
Charley, que fez devastação na Flórida. Naquela ocasião, feito abutres na
carniça, empresários se aproveitavam da fragilidade das pessoas atingidas para
extorqui-las. Entre os exemplos de extorsão dados pelo autor estão a cobrança
de vinte e três mil dólares para que fossem retiradas duas árvores caídas sobre
uma casa, e um casal desabrigado de idosos com uma filha deficiente que se viu
obrigado a pagar cento e sessenta dólares para que pudessem se abrigar por uma
noite num motel, quando o preço normal era de apenas quarenta dólares. Não
obstante tanta brutalidade, pode-se garantir que se declaram cristãos tanto
estes monstros aproveitadores do sofrimento de quem sofre quanto os economistas
que afirmavam na ocasião e certamente ainda hoje e sempre não haver nada de
anormal em tal procedimento porquanto se trata de Livre Mercado, onde as
pessoas que compram e vendem determinam o valor da transação comercial. A
canalhice destes sabujos de ricos subestima a capacidade de racionar das
pessoas porque aquele que se encontra fragilizado tanto pelo inusitado da
emergência quanto pelo sofrimento não dispõe do poder de barganha. É a estúpida
humanidade, como foi classificada pelo historiador Henry Thomas. E haja
estupidez para determinar comportamento tão selvagem em seres espiritualmente
bestiais, não obstante a capacidade de raciocinar. Não há como não merecer ser
chamado de bestas seres capazes de se aproveitarem do sofrimento do semelhante
para levar o que acredita erradamente ser vantagem porque não há vantagem na
desunião uma vez que sociedade alguma chega a bom termo com seus membros se
devorando mutuamente. Toda e qualquer sociedade precisa antes de tudo da união
de todos os elementos que a compõem em torno do objetivo a que se propõem, o
bem-estar, no caso da sociedade humana. Como pode alguém ter a tranquilidade
necessária para que haja bem-estar estando de vigília constante contra um
ataque iminente e inevitável que virá a qualquer hora e de qualquer lugar, como
acontece nas sociedades que apesar de chamadas de civilizadas não raro
acontecem rajadas de metralhadora sobre requebradores de quadris? Mas é assim
que caminha a humanidade. Aos trancos e barranco, devorando-se a si mesma numa
antropofagia explicável apenas pela estupidez a que se referia o historiador
acima mencionado.
Ante tanta
rudeza espiritual, onde fica o sentimento cristão do qual as bestas humanas se
dizem seguidoras? Apesar de anos atrasados em relação aos ateus no que diz
respeito a solidariedade humana, estes molambos espirituais torcem o nariz para
quem despreza a cretinice de lamber o saco de um deus capaz de nomear
criminosos para representá-lo. Graças à sua monumental ignorância os religiosos
odeiam aquele que se declara ateu por desconhecerem serem estes capazes de
conviver em paz entre graças à certeza não só de que seu bem-estar depende das
próprias pessoas, mas também de depender da união de todos a tão almejada
tranquilidade que as feras humanas dizem ter por objetivo. Uma sociedade de
ateus não admitiria jamais a desumanidade mais condizente com Satanás praticada
pela indústria farmacêutica capitalista e cristã ao se aproveitar da
infelicidade dos doentes para extorquir deles as fortunas que acumulam à custa
do sofrimento de quem sofre. É o que fazem estes MONSTROS E CANALHAS em cujos
escritórios não falta a imagem de Cristo Crucificado onde deveria haver a
lembrança do demônio.
Mas é assim
que caminha a humanidade: usando o vigor da sua juventude para festejamentos,
inclusive religiosos, carregando imagens prá cima e prá baixo entre cânticos,
ignorando estar sendo esperada por uma velhice chorosa nos corredores dos
hospitais a lamentar o tempo estupidamente jogado fora por ter se dedicado
exclusivamente às mesmas atividades das bestas: trabalhar, comer, trepar e
cagar. Os ricos, em vez do corredor, irão contribuir para a obesidade da conta
bancária da UTI onde descobrirão a duras penas que a riqueza não tem a grandeza
que supunham ter.
É assim que
caminha a humanidade: detestando Marx cujas ideias estão muito mais próximas da
irmandade recomendada pelo Cristo que diz lhe servir de paradigma. Por estas e
outras é que não se justifica a indiferença quanto à necessidade de se pensar
em substituir por outra esta fase histórica tão obscura em termos de
civilização quanto a pior fase da Idade Média. Inté.
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